Fernando Pessoa - Natal

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Nasce um Deus. Outros morrem. A Verdade
Nem veio nem se foi: o Erro mudou.
Temos agora uma outra Eternidade,
E era sempre melhor o que passou.
Cega, a Ciência a inútil gleba lavra.
Louca, a Fé vive o sonho do seu culto.
Um novo Deus é só uma palavra.
Não procures nem creias: tudo é oculto.

Fernando Pessoa

Natal no youtube

Fernando Pessoa - 'Chove. É dia de Natal.'

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Chove. É dia de Natal.
Lá para o Norte é melhor:
Há a neve que faz mal,
E o frio que ainda é pior.

E toda a gente é contente
Porque é dia de o ficar.
Chove no Natal presente.
Antes isso que nevar.

Pois apesar de ser esse
O Natal da convenção,
Quando o corpo me arrefece
Tenho o frio e Natal não.

Deixo sentir a quem quadra
E o Natal a quem o fez,
Pois se escrevo ainda outra quadra
Fico gelado dos pés.

Fernando Pessoa

Fernando Pessoa - 'Natal, na província neva'

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Natal... Na província neva.
Nos lares aconchegados,
Um sentimento conserva
Os sentimentos passados.
Coração oposto ao mundo,
Como a família é verdade!
Meu pensamento é profundo,
Stou só e sonho saudade.

E como é branca de graça
A paisagem que não sei,
Vista de trás da vidraça
Do lar que nunca terei!

Fernando Pessoa (Notícias Ilustrado, n.º 29, 30 de Dezembro de 1928)

A Fragmentação do "Eu" em Fernando Pessoa

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A fragmentação do “eu” de Fernando Pessoa resulta da constante procura de resposta para o enigma do ser, aliada à perda de identidade.

Na verdade, Pessoa vê-se confrontado com a sua pluralidade, ou seja, com diferentes “eus”, sem saber quem é nem se realmente existe. Contudo, a negação do “eu” como um todo, leva-nos à forma como os heterónimos foram criados, que nos demonstra a angústia da procura pelo desvendo da vida e da morte, da perfeição e da tristeza, da humanidade e da divindade, expressa, por exemplo, no verso “Para poder nunca esgotar os meus desejos de identidade” de Álvaro de Campos. Por vezes, o próprio "eu" lírico contradiz-se, tentando entender o seu desajustamento, a exemplo no verso “Multipliquei-me, para me sentir”.

Por outro lado, Pessoa viveu a aurora do tempo em que Deus estava morto, tendo encontrado a salvação na fragmentação, na vida inventada, em que cada um dos seus heterónimos exprime um novo modo de ser e uma visão própria do mundo. Pode dizer-se que Fernando Pessoa é o poeta do não ser imaginário, sendo a heteronímia a busca de outros sentidos para a vida.

Em suma, Pessoa apresenta um diálogo múltiplo e descentrado, sendo que a sua despersonalização se trata do desaparecimento do “eu” para fazer surgir a persona, isto é, a máscara.

Texto Expositivo-Argumentativo escrito por Rita Cordeiro

O Neopaganismo e a crença no destino em Ricardo Reis

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Ricardo Reis é o poeta clássico, da serenidade epicurista, que aceita, com calma e lucidez, a relatividade e a fugacidade de todas as coisas. “Vem sentar-te comigo Lídia à beira do rio”, “Prefiro rosas, meu amor à pátria” são poemas que nos mostram que este discípulo de Caeiro aceita a antiga crença nos deuses, enquanto disciplinadora das nossas emoções e sentimentos, mas defende, sobretudo, a busca de uma felicidade relativa alcançada pela indiferença à perturbação.

Sente que tem de viver em conformidade com as leis do destino, indiferente à dor e ao desprazer, numa verdadeira ilusão da felicidade, conseguida pelo esforço estóico lúcido e disciplinado.

Ricardo Reis, que adquiriu a lição de paganismo espontâneo de Caeiro, cultiva um neoclassicismo neopagão (crê nos deuses e nas presenças quase divinas que habitam todas as coisas), recorrendo à mitologia greco-latina, e considera a brevidade, a fugacidade e a transitoriedade da vida, pois sabe que o tempo passa e tudo é efémero. Daí fazer a apologia da indiferença solene diante do poder dos deuses e do destino inelutável. Considera que a verdadeira sabedoria de vida é viver de forma equilibrada e serena.

Em grande parte devido ao seu paganismo, aceita o destino com naturalidade, considerando que os deuses estão acima do homem por uma questão de grau, mas que acima dos deuses, no sistema pagão, apenas se encontra o Fado, que tudo submete.

Em suma,acreditando na liberdade concedida pelos deuses, Ricardo Reis procura alcançar a quietude e a perfeição dos mesmos, indiferentes mas omnipresentes, que se confundem connosco sempre que os imitamos, pois estes não são mais que homens mais perfeitos ou aperfeiçoados.

Texto Expositivo-Argumentativo escrito por Iva Santos
 
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